terça-feira, 11 de março de 2008

Poder judiciário

É o que interpreta e julga disputas a respeito das leis. O poder judiciário é extremamente importante para qualquer país, pois representa o fórum de resolução de conflitos dentro do sistema democrático. Em um cenário ideal, o judiciário é enxuto e eficiente, sendo que as instâncias mais baixas julgam rapidamente processos baseando-se na lei, no cumprimento dos contratos e especialmente nos processos similares já julgados pelas instâncias superiores.

Infelizmente, em nosso país, a legislação brasileira é uma das mais extensas e confusas do mundo. Isso faz com que os casos de dúvida sejam muito freqüentes e a demanda sobre o poder judiciário seja enorme, tornando esse ineficiente braço do Estado extremamente lento. Processos que poderiam ser resolvidos em poucos meses levam anos para terminar,aumentando os custos para as partes litigantes e para o governo. Apesar de o Brasil contar com 40% a mais de funcionários por vara que a média mundial (14 versus 10) e gastar com esse setor quatro vezes mais que países semelhantes (3,7% do orçamento público versus 1% no caso do México), nosso judiciário não dá conta do volume de trabalho. Hoje existem mais de 50 milhões de processos em tramitação na Justiça, sendo que esse número deve dobrar na próxima década. As conseqüências dessa situação para quem produz são desastrosas.

Se um cliente deixar de pagar, por exemplo, R$ 50 mil de uma determinada dívida, o custo judicial para recuperar esse valor será de cerca de R$ 37 mil, quase 75% do valor do crédito. O prazo para recuperar judicialmente um imóvel pode chegar a 12 anos! Isso aumenta os juros cobrados por bancos e empresas, como forma de se protegerem, e machuca a economia. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a taxa de crescimento do PIB poderia ser 25% maior caso o sistema judiciário funcionasse corretamente.

Os problemas começam no Supremo Tribunal Federal. Nos Estados Unidos, a Suprema Corte julga apenas 200 casos por ano, restringindo-se a casos extremamente complexos ou de forte impacto para o país. Cada decisão da Suprema Corte costuma orientar milhares de decisões nas instâncias inferiores, de modo que um mesmo problema não tenha que tramitar diversas vezes pelos tribunais. O Supremo Tribunal Federal é o equivalente brasileiro. No entanto, passam anualmente por ele mais de cem mil processos, a maior parte dos quais exatamente iguais a processos anteriores já decididos. Isso torna muito difícil para esse órgão avaliar com calma as questões realmente importantes e contribui para sua própria inoperância.

O sistema judiciário trabalhista também apresenta sérios problemas. Nos últimos anos, segundo dados do sociólogo José Pastore, o judiciário vem recebendo uma média de dois milhões de novas ações trabalhistas por ano. Esse é disparado o maior número em todo o planeta. Para fins de comparação, nos Estados Unidos, a média é de 75 mil, na França, 70 mil, 30 vezes menos. Para cada R$ 1.000 julgados, a Justiça do Trabalho gasta cerca de R$ 1.300. Isso é o resultado do baixo nível de eficiência do judiciário e também é causado pelo anacronismo da legislação brasileira sobre o assunto. Veremos mais detalhes sobre isso no capítulo sobre a reforma trabalhista.

Por fim, pesquisas recentes com juízes demonstraram que o respeito às leis e aos contratos não é prioridade para os magistrados. Quase dois terços dos entrevistados afirmaram que atender às necessidades sociais é mais importante do que respeitar as regras de um contrato. Apesar disso soar bonito na teoria, essa absoluta distorção do papel do judiciário causa insegurança e perda de investimentos, uma vez que toda empresa instalada ou não no País sabe que seus planos de negócio, mesmo assinados e confirmados pelo governo, estão sujeitos às inclinações sociais e às preferências dos juízes. Existem diversas ações que precisam ser tomadas para melhorar esse quadro. A primeira delas é a simplificação da estrutura judiciária. Hoje existem diversos braços desse poder: os tribunais de alçada, os tribunais de justiça, os juizados especiais, as varas criminais, os tribunais de júri, os tribunais eleitorais, os tribunais do trabalho, os tribunais federais, os tribunais militares, o Supremo Tribunal de Justiça, o Supremo Tribunal Federal e outros. O ideal seria enxugar fortemente o poder judiciário, consolidando os diversos braços em apenas três, sendo a divisão feita por nível. Dentro de cada nível, haveria cortes especializadas nos diversos assuntos a serem tratados. Essas cortes usariam as referências do Supremo Tribunal Federal como guia para julgar casos similares. Ou seja, é imprescindível que haja juízes especializados em suas determinadas áreas jurídicas, como o direito do trabalho, o direito rural etc. O que não é necessário é haver complexas estruturas burocráticas independentes para apoiar cada tribunal.

Além disso, é preciso melhorar as práticas de gestão, informatizando os tribunais, contratando administradores para gerenciar os tribunais e deixando os juízes com 100% de seu tempo voltado a julgar casos. Hoje a maior parte do expediente dos magistrados é consumida em tarefas administrativas e burocráticas.

Sempre que possível, o trabalho deve ser realizado pela iniciativa privada, que é mais eficiente. Ao governo cabe julgar os conflitos entre as partes. O Estado deve contratar, avaliar, manter e remunerar os juizes, garantindo a imparcialidade das decisões, mas não precisa manter a estrutura responsável pela burocracia jurídica.

Todas as varas e os tribunais judiciários deveriam ter sua parte burocrática privatizada. Ao Estado caberia somente a manutenção dos juizes e talvez alguns assistentes. O papel do juiz é escutar as partes, ter acesso a todas informações possíveis e tomar uma decisão imparcial com base na lei. As empresas privadas responsáveis pelo trâmite das burocracias jurídicas podem ser remuneradas por seu desempenho e punidas caso se constate alguma irregularidade em seu trabalho. Desta maneira, o tempo de demora dos processos diminuiria consideravelmente.

Outra ação importante a ser tomada é reduzir o tempo de processo valorizando cada vez mais os acordos extrajudiciais e usando intensivamente a jurisprudência para evitar julgar diversas vezes a mesma questão. Assuntos já decididos pelo Supremo Tribunal Federal devem ter seu desfecho resolvido instantaneamente.

É fundamental também que o poder judiciário permita uma ágil cobrança judicial e execução de bens. Economias modernas são fundamentadas na concessão de crédito. Se o recebimento de créditos não for uma atividade protegida pela lei, todo o sistema sofre, uma vez que bancos e emprestadores de dinheiro tendem a embutir nos juros o custo esperado com a burocracia de recebimento das dívidas. Isso aumenta o custo do dinheiro e prejudica todos, exceto os caloteiros. Existe uma lei no Brasil que impede que a casa própria de determinada família seja tomada como forma de pagamento de dívidas. Essa medida aparentemente humanitária teve como objetivo proteger as pessoas contra o despejo. No entanto, a realidade é que a tal lei é uma bobagem que impede as famílias de utilizar seu ativo mais valioso como colateral para obter empréstimos e investir. O México, por exemplo, constrói seis vezes mais metros quadrados por habitante do que o Brasil. Parte da explicação é que lá o acesso ao crédito imobiliário é muito maior, uma vez que o judiciário e a legislação não protegem os caloteiros como ocorre no Brasil.

Por fim, uma grande medida que se faz necessária está fora do âmbito judiciário. Grande parte do acúmulo de processos ocorre em virtude da confusão causada pela legislação brasileira, longa, complexa, contraditória e em constante mudança. Como falaremos adiante, somente na área tributária, o governo cria oito mil regras por ano. As dúvidas e os conflitos causados por essa monstruosidade são a causa de grande parte dos processos tributários.

Neste livro, é proposta uma forte redução no tamanho da Constituição Brasileira, fazendo com que a versão gerada em 1988 seja substituída por uma ou duas páginas. O mesmo deve ocorrer com as leis ordinárias. É preciso enxugar o volume de leis no Brasil. A simplificação das leis deve reduzir a carga de trabalho do judiciário.





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